segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Na clandestinidade

O Sábado passado, dia 28 de Setembro, foi marcado como o Dia Latino-Americano de Luta pela Descriminalização e Legalização do Aborto. Sobre isto, vou falar de forma direta: 

Como mulher (neste caso, também como brasileira) e como mãe, não posso estar de acordo com a realização do aborto como algo naturalmente aconselhável, como um método contraceptivo; mas também não o vejo, como entendem alguns, como o simples ato de "matar criancinhas". Como jurista (neste caso, também como mulher), luto pelo cumprimento dos direitos consagrados internacional e constitucionalmente, sou contra toda a forma de discriminação, sou a favor da liberdade e prego a total separação entre Estado e moral. É neste terreno, movediço, que se situa o problema do aborto. Problema que cresce de tamanho quando fixados os olhos nos dados de uma pesquisa realizada em 2010, no Brasil, onde se verifica:
  1. 1 em cada 5 das mulheres entrevistadas, já realizaram aborto ao completar 40 anos;
  2. 1 milhão de abortamentos clandestinos e 250 mil internações por complicações é realizado anualmente no Brasil;
  3. 1 brasileira morre a cada 2 dias em consequência de abortamento inseguro;
  4. Em 2012, mais de 197 mil curetagens foram realizadas pela rede pública hospitalar, em decorrência de abortamentos provocados e espontâneos;
  5. A incidência de abortos entre mulheres de diferentes religiões é praticamente igual.
É muito importante ter em mente que aborto clandestino é diferente de aborto inseguro. Na verdade, a clandestinidade tem a ver com a proibição legal. Mas na impossibilidade, a mulher decidida a abortar, se tem recursos financeiros, desloca-se a uma clínica privada e desembolsa cerca de 2 mil dólares para a realização do procedimento de forma segura; caso contrário, recorre a métodos caseiros, sem nenhum cuidado com higiene ou assepsia, correndo risco de vida. Daí que, o grande problema do abortamento clandestino, e que se combate, é a desigualdade social.

A proibição legal não impede e nem faz diminuir o número de abortamentos. Basta dizer que, no Uruguai, desde a descriminalização do aborto ocorrida em Outubro de 2012, notou-se uma queda vertiginosa tanto no número de mortes maternas quanto no de abortos realizados, que passou de 33 mil por ano para apenas 4 mil. A experiência brasileira é ainda mais desastrosa, quando considerada a falta de uma política de planeamento familiar eficiente.

Por tudo isto, longe de minhas concepções pessoais, longe de ser bom, longe de ser recomendável, a legalização do aborto sob determinadas condições é sentida como uma necessidade de saúde pública. O aborto, na grande maioria das vezes, vem na sequência do abandono, do desemprego, do desespero. Julgar e condenar essas mulheres, lança-las na fogueira da opinião popular, é talvez uma crueldade maior do que a dor que já sentem. Portanto, a questão se resume em dar a elas o direito de decidirem de acordo com a sua própria consciência e medida.


Fonte: Pública

3 comentários:

  1. Mais uma vez, um excelente texto! Mto obrigado pela partilha! Concordo com a sua opinião a 200%!
    Beijinhos e continuação de bom trabalho!

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    1. Obrigada, Joana! Gosto muito que você leia e dê sua opinião! Beijinho.

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