Conheci a Helena nas aulas do curso e não criamos propriamente uma amizade instantânea. Acho que ela olhava-me com alguma desconfiança e eu achava-me estúpida ao pé dela! Até que, provavelmente, a convivência mostrou-nos que estávamos erradas. A Helena é uma pessoa, ao que me parece, reservada; mas depois, esconde qualquer coisa de terno quando sorri largamente, como quem guarda lá dentro o melhor do mundo apenas para quem, merecidamente, a conquista. Não sei bem se é assim, relativamente à Helena a única certeza que tenho é que ela é mesmo intelectualmente privilegiada, é sensível às causas humanas e à música erudita, além de simpatizarmos sinceramente uma com a outra. Somos amigas e isto é suficiente.
Ontem, a Helena surpreendeu-me - a mim e a outros amigos seus brasileiros - com um texto que me deixou emocionada. Bem, eu tenho "10 anos de Portugal" (nem gosto de fazer essas contas!) e nem sempre foi fácil (como não é para nenhum imigrante!). Claro que, para alguns, eu era "engraçada", falava "como nas novelas" e por vezes despertava uma espécie de encantamento. Outras vezes, tive de quebrar preconceitos, mostrar meus verdadeiros valores numa terra ressabiada de histórias passadas, conquistar amigos. Até hoje, todos os dias, dou continuidade a esta cansativa tarefa. Talvez por isto este texto que a Helena dedicou também a mim - na sequência do vídeo com o depoimento do escritor Valter Hugo Mãe na 9ª Festa Literária Internacional de Paraty - me deixou não somente orgulhosa e feliz mas sobretudo acarinhada! Confirmou tudo o que eu sentia a respeito da minha amiga Helena.
Assim, com a sua autorização, partilho o seu delicioso texto. Não deixem de ler (e ver o vídeo a que me refiro, link aqui, até o final) e percebam bem a importância do Brasil para uma geração de portugueses desenvergonhadamente felizes conosco.
Era uma vez as "primas do Brasil". Não eram minhas, as primas, mas era assim que todos se lhes referiam (talvez por isso eu nunca tenha chegado a decorar os nomes delas, à excepção de uma, que era Olga, e cujo rosto o tempo levou).
As primas do Brasil chegavam com o Verão. Na verdade, era como se o Verão chegasse com elas. E era ver os primos (os que eram mesmo primos, primos verdadeiros, e os que eram tão primos quanto eu) muito animados, e as mulheres dos primos dando todos os sinais conhecidos da ciumeira.
Mesmo pequena, compreendia-os. A eles e a elas. É que as primas do Brasil tinham qualquer coisa. E não seria, como recorda o Valter, saberem os finais das novelas, porque não me lembro se alguma vez foram questionadas sobre isso. Mas tinham qualquer coisa. Era, talvez, o português adocicado, aquele tch-tch-tch que apetece ouvir bem perto, junto ao ouvido. Era, certamente, o decote mais cavado do que o que se usava por cá. Era o tom da pele e o ar cuidado. Era o balançado, aquele, o mesmo da garota da Ipanema do Tom.
As primas do Brasil não eram mulheres: eram aviões (embora, na época, ainda não conhecêssemos essa vossa expressão). Aviões com grandes e finas argolas de ouro nas orelhas.
As primas do Brasil pousavam a mão em nós quando falavam. E falavam muito. Por isso pousavam muitas vezes a mão e era bom. E sorriam. E o sorriso era lânguido e lento, um sorriso de preguiça tropical, húmida e quente. Então os primos ficavam mais solícitos, mais cavalheiros. Abriam as portas, davam passagem, e tudo parecia acontecer ao ralenti como no cinema. E as mulheres queriam ficar zangadas. E ficavam. Mas nem elas resistiam bem àquele charme dengoso que só conhecíamos nos personagens do Jorge Amado.
As primas do Brasil acordavam a nossa fantasia do país de onde vinham, da lonjura e da vida boa. Hoje, acho que elas eram, sobretudo, alegres. E a alegria, pelo menos para um português, pode ser uma coisa profunda, inesperadamente sensual.
(Helena Guimarães)
Núbia, minha querida Amiga: estou sorrindo largamente para ti.
ResponderEliminarQue bom! :D
EliminarLindo!
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