sexta-feira, 14 de março de 2014

Da última vez em que não te vi...




Pai, faz hoje 4 anos. Custou-me tanto, dilacerou-me por dentro! Foi sem dúvida a minha viagem mais difícil - e talvez a sua também! Custou-me não ter chegado a tempo de nos abraçar, de dizermos tudo que não dissemos, de chorar até esvaziar o coração, de nos despedir. E custou-me mais ainda não saber aquilo que você queria tanto me dizer! 

Pai, há pessoas que ao longo da vida deixam acumuladas muitas obras mas só depois que se vão deixam o seu feito mais importante: o ensinamento. 

Pai, você é para mim uma dessas pessoas. Talvez tenha calhado a mim o quinhão mais valioso, aquele que não me podem tirar...

Pai, obrigada! Só agora eu compreendo que não me facilitar a vida era a sua forma de me amar. Fez-me forte! 

Pai, perdão! Os anos e as mazelas lhe tornaram um homem mais sereno e mais resignado... tristemente resignado... e eu achava que aquele olhar vago e distante era só a ausência de motivos. Mas não era. Eu deveria ter me importado! Deveria ter lhe convencido a sentir mais vezes o ar fresco do campo e o cheiro das nossas lembranças. Se pelo menos tivéssemos tido mais uma derradeira vez!

Pai, eu estou sempre a me perguntar o que você levou em troca da vida. Espero que tenha levado os momentos em que fomos felizes: os nossos fins de semana na fazenda; as festas do Dia de Reis; as nossas fogueiras de São João; os sábados de feira-livre; as horas que passamos a ler os manuais dos carros; o lombo dos cavalos; os almoços que a mãe preparava ao seu gosto; os doces sem açúcar por causa do seu diabetes; as nossas conversas sobre a vida; o cheiro da minha primeira filha, a que você pode conhecer sem ver; o meu amor.  

Pai, eu estava a caminho (precisava que você soubesse que eu estava a caminho!). O caminho era longo, pai, mas não nos afastou! Todas as vezes em que nos despedíamos era como se fosse a última vez. Era doloroso e talvez tenha sido melhor assim, sem mais uma última vez... 

Pai, um dia, quando as minhas filhas forem mais crescidas, eu lhes contarei mais das histórias do avô e lhes ensinarei tudo que aprendi com você.

Pai, eu acho que já sei o que você queria me dizer. Descanse, pai, eu entendo!

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